Líderes modernos, crenças arcaicas

*por Cezar Almeida

Foto: Pippalou (morgueFile.com)

Foto: Pippalou (morgueFile.com)

Conversando com gestores de uma multinacional industrial, eles confessaram-me que estavam decepcionados com um projeto que não deu certo na companhia: um programa de sugestões. Relataram que, no começo, o programa foi interessante e deu resultados, mas com o passar do tempo cada vez menos sugestões eram dadas e o programa foi minguando até chegar à extinção. Na avaliação deles, o que faltou foi mais incentivo das lideranças para a ação continuar tendo êxito e eu concordei. Inclusive, esta pode ser também a realidade de muitos outros programas de várias outras companhias mundo a fora: projetos interessantes começam bem e são interrompidos por falta de incentivo das lideranças.

Diversas pesquisas e estudos vem comprovando que os líderes são os grandes responsáveis pela criação de um bom ambiente de trabalho e pelo engajamento dos colaboradores. Estes mesmos estudos mostram também que organizações que têm um bom ambiente interno e colaboradores mais engajados dão mais lucro, são mais produtivas e tem pessoas mais saudáveis e felizes em seus quadros. Uma das maneiras mais eficazes de engajar mais as pessoas e transformar o lugar que se trabalha é justamente ouvi-las mais, dar-lhes voz para opinar e participar da gestão, sendo receptivo às idéias e sugestões de todos. Esta participação, quando estimulada e respeitada, gera nas pessoas um sentimento de fazer parte, de pertencer de verdade àquela organização, e isto transforma positivamente o ambiente. Além disso, ao ter mais gente participando, a chance de boas idéias surgirem aumenta, fruto de pura e simples da probalidade estatística.

Fica a pergunta: já que tem tantos benefícios, por que então líderes deixariam acabar um programa que objetiva a participação dos seus colaboradores na gestão? Parece um contra-senso que uma ação que vai gerar mais resultados para os próprios líderes seja minada por eles mesmos! Gostaria de levantar uma possível causa do boicote desta e muitas outras iniciativas: crenças arcaicas das lideranças.

Chave antiga.

Arcaico é uma palavra de conceito fácil e autoexplicativa e refere-se a tudo que é velho, antigo e ultrapassado. O que não tem mais relação com a contemporâneadade e pode até ter sido uma forma de pensar dominante tempos atrás, mas não encontra mais paralelo com o presente.

Já as crenças são os óculos que vemos o mundo. É tudo aquilo que acreditamos como verdade, que nos faz tomar decisões e se materializa com afirmações que corroboram ou negam algo. Por exemplo, uma pessoa que acredita que a cor da pele, além de uma simples característica física, é algo que categoriza as pessoas em primeira ou segunda classe, poderia ter uma crença do tipo: “a cor da pele de alguém define quem uma pessoa é”. Ou ainda, “uma pessoa dar cor de pela tal é uma pessoa que é assim e assado”. Isto faz com que ela manifeste esta crença no seu cotidiano com o racismo, discriminação e preconceito. Uma pessoa racista tem, então, uma crença arcaica, um óculos que faz com que ela veja o mundo como era visto séculos atrás.

Líderes também podem manifestar na sua liderança comportamentos que, quando analisamos mais de perto, percebemos que são derivados do seu sistema de crenças. Vamos imaginar que um líder acredite que ele tem as melhores idéias da equipe, que ele é o mais inteligente e que, só ele, consegue fazer bem feito as coisas. Ora, se ele pensa isso, ele pode manifestar uma crença como por exemplo: “ninguém da minha equipe conseguirá ter melhores idéias do que eu” ou “acredito que as idéias vindas da equipe agregam pouco ou nada ao negócio”. Quem sabe até algo do tipo “eu sou o mais inteligente desta empresa e sempre as melhores idéias virão de mim”. Ter estas crenças podem gerar comportamentos que não valorizam a contribuição dos outros, não estimulam a participação na gestão e, consequentemente, as pessoas fiquem menos engajadas, influenciando negativamente no ambiente de trabalho.

É muito importante para líderes e todas as pessoas de um modo geral estarem atentas ao seu sistema de crenças e observarem quais podem ser impeditivas para o seu desenvolvimento profissional e pessoal. Eu tenho uma crença que as crenças podem ser identificadas e modificadas. Por isso, faço com frequencia uma análise de minhas decisões e comportamentos, tentando emergir à tona quais crenças estão por tras. Isso permite que eu fique mais consciente de minha ações e perceba quando uma crença pode ser um obstáculo ao meu desenvolvimento.

Convido-o também a fazer esta análise e se perguntar: quais crenças eu tenho sobre liderança? De que forma estas crenças auxiliam ou atrapalham as minhas ações? Um outro caminho também é observar as suas ações e, a partir delas, observar quais são as suas crenças. Após observar e identificar suas crenças, analise uma a uma e é possível que você tenha algumas descobertas interessantes sobre você e seus comportamentos. Caso apareça alguma crença arcaica, não se desespere e siga adiante para mudá-la, porque no fundo mesmo, muitos de nós (e eu me incluo obviamente) tem um pouco de arcaico dentro de si. O mais importante é que estamos vivos e ainda dá tempo de mudar.

Artigo: O interesse desinteressado de vender!

*por Cezar Almeida

Muitos gestores se deparam com um dilema diário muito comum organizações mundo a fora: vender mais. Muitas horas de reuniões, estratégias, visitas, atendimento, divulgação e diversas outras ações são pensadas e executadas em companhias de todo o planeta, todos os dias, para que seus produtos e serviços tenham maiores volumes de vendas.

Vendo Bicicleta!

Foto: Squaio (MorgueFile.com)

O que muitas vezes observa-se ao treinar gestores e equipes de vendas é que, apesar de seus líderes serem competentes e muitas vezes também suas equipes, a pressão por vender e por resultados acaba tirando o foco do principal fator em um processo comercial: o cliente. Estar verdadeiramente interessado no cliente é fundamental para conseguir diagnósticar como e se o produto ou serviço que temos para oferecer conseguirá atender às necessidades dele.

Mas de onde pode vir esta falta completa de atenção e cuidado com o cliente e de que forma pode-se resgatá-la se este for o caso de sua companhia? Ninguém pode afirmar categoricamente, sem conhecer a fundo a realidade de uma empresa, de um mercado e também de uma equipe, qual estratégia deverá ser adotada para que o cliente volte a ser foco. Porém uma coisa pode-se afirmar que atrapalha manter o foco no cliente e é vista em muitas pessoas, sejam da área comercial ou não: o autocentramento.

As pessoas autocentradas só pensam em si e tem muita dificuldade de ter empatia e se colocar no lugar do outro, realmente entregar-se ao outro por um momento, entender seu ponto de vista e ouvir com tudo que tem. Recentemente, ouvi de uma especialista sobre o comportamento humano que o autocentramento tem se manifestado cada vez mais de tal forma que as pessoas, ao ouvirem algo sobre um tema, acabam logo falando de si cada vez mais. Coisas do tipo: alguém fala “eu sou do signo de leão” e a outra pessoa já responde “e eu de virgem!”. Ou também um outro pode dizer “acabei de chegar da Europa” e seu interlocutor já fala “eu fui aos Estados Unidos ano passado”. Mas quem perguntou o signo ou para onde a outra pessoa viajou? Ninguém! Mas se o assunto é o zodíaco, viagem ou qualquer outro tema, pessoas autocentradas querem logo dar a sua opinião e falar de si. Nas vendas, acontece a mesma coisa. Porém o que o cliente quer e precisa é de alguém que o ouça, entenda e apresente alguma solução que atenda uma necessidade, resolva um problema ou lhe traga algum benefício.

Precisa-se então, para conseguirmos vender mais com o foco no cliente, praticar o interesse desinteressado. Apesar de termos metas e foco no resultado de nossas ações, vendedores precisam entender minimamente quem é o cliente e o que ele quer para encontrar a melhor solução para ele, seja em uma loja de roupa ou na indústria aeronáutica, tanto faz o mercado ou o produto. A pessoa do outro lado, o cliente, tem que ser o foco no contato da venda. Controlar a ansiedade, fazer perguntas e calar a boca para ouvir as respostas são práticas indispensáveis para quem quer se interessar mais pelos seus clientes, descobrir suas necessidades e, só depois disso, mostrar para ele que seu produto ou serviço é uma solução viável. Assim, ficará muito mais fácil convencer o cliente e vender mais.

Exercitar isso no início será um desafio para muitas pessoas, mas com o tempo e sempre em mente e no coração o foco no cliente, é possível que esta prática se torne tão natural que a gente nem mais perceba. Quando chegar este momento, além de construir uma carteira de clientes fiéis e engajados com a sua companhia, é possível também fazer verdadeiros amigos ao longo desta estrada. Vender é relacionar e não há melhor maneira para construir boas relações ao longo da vida do que se interessar de maneira integral ao outro, nem que seja por um tempo pequeno do seu dia.